Estive estes anos todos a observar este “processo” sem me manifestar mas considero que chegou o momento de escrever uma ou duas coisas sobre ele.
O processo Casa Pia arrasta-se há mais de 7 anos e pelos vistos ainda não terminou, ou porque não disponibilizam o Acórdão ou porque existem problemas informáticos, ou porque ainda existem recursos dos arguidos, ou porque os alunos já esqueceram o crime porque faleceram da velhice, ou por outra coisa qualquer. O que é certo é que a justiça portuguesa é muito lenta e ninguém sabe explicar o porquê. Aliás, ninguém sabia explicar até hoje, mas eu descobri as verdadeiras razões desta lentidão que decidi partilhar com os dois ou três leitores que acedem ao Ainda Pior Blog (porque provavelmente não terão nada mais importante para fazer). Vou então enumerar essas razões:
- Comunicação Social - A primeira razão dos processos serem lentos reside no facto de existir comunicação social. Em cada mega-processo existem centenas e até milhares de intervenientes, como o caso dos advogados, juízes, arguidos, vítimas e testemunhas. Até aqui nada de novo, mas já imaginaram quantas e quantas horas perdem estas pessoas com os jornalistas, seja a responder a perguntas em entrevistas ou simplesmente a desviarem-se deles para não serem incomodados? Os jornalistas são tão persistentes que depois acabam por dominar melhor os casos do que os próprios intervenientes directos e depois, claro está, surgem mais atrasos, porque são os intervenientes que ficam à espera de recolherem mais informações nos órgãos de comunicação e passam o tempo a verem telejornais, a lerem jornais e revistas à procura das dicas certas para avançarem e conseguirem os seus objectivos no processo. Para que a justiça portuguesa seja um pouco mais célere, basta que os jornalistas não se envolvam até o processo terminar (mesmo) e só no final divulguem o que aconteceu, quem foram as vítimas, quem foram os culpados e quais foram as sentenças.
- Vestuário – Considero que o guarda-roupa dos juízes é outra das causas dos atrasos na justiça. Para que é que servem afinal aquelas vestimentas que os juízes são obrigados a usar senão para causarem mais entropia nos processos? Se não sabem ao que me refiro, vejam a foto da juíza Ana Peres em cima. Quantas e quantas horas perdem os juízes a vestir e a despir estas fatiotas que para nada servem? Até ao dia de hoje pensava que estas indumentárias teriam o nome de fato-macaco de juiz, mas afinal denominam-se “toga”, que pelos vistos vem do latim e significa cobrir. Apesar de o termo ser bastante apropriado tendo em conta o tema do processo, o nome destas roupas não justifica as demoras que causam a sua utilização. Os juízes só não introduziram ainda mais entropia porque decidiram não usar as perucas brancas com cabelo encaracolado que usam em alguns países, como na Inglaterra, por exemplo e tudo porque os processos são todos tão demorados que os cabelos brancos nos intervenientes acabam por aparecer naturalmente devido à velhice.
- Informática – Existem também horas e horas de atraso causadas por problemas informáticos uma vez que sempre que existe um atraso, aparece logo alguém a dizer que foi um erro informático. Ouvindo isto assim a seco e sem perceber nada do assunto, poderia ser tentado a pensar que quem deveria ser sentado no banco dos réus eram todos os engenheiros informáticos que desenvolvem software e todos os administradores de sistemas que gerem as máquinas e as infra-estruturas de rede dos tribunais. O que acontece de facto e merece ser desmistificado é que os atrasos na realidade são causados por existir o mito que os problemas estão sempre relacionados com a informática. Passo a explicar… Como os informáticos são sempre considerados os bodes expiatórios para tudo, recai sobre eles uma pressão insuportável que os obriga a confirmar centenas de vezes que fizeram as suas tarefas bem, perdendo um pouco a confiança no seu trabalho. Ora, este cuidado excessivo e por vezes até doentio provoca que uma tarefa que deveria demorar um minuto possa demorar dias, devido ao número de vezes que é confirmada e como o cansaço aumenta, aumenta também a probabilidade de erro e então, mas muito raramente, lá aparece no meio deste mito todo um ou outro bug ou erro informático genuíno, o resto é pura especulação.
- Analfabetismo – Outra das razões que encontro para a demora na justiça é o facto de ser necessário existir a leitura do Acórdão. Não sei bem qual foi a razão desta tarefa ter sido incorporada na lei, nem quando foi introduzida, mas presumo que tenha sido introduzida porque antes as pessoas eram todas analfabetas e então era necessário alguém explicar o que tinha sido decidido nas sentenças dos processos. Se for esta na realidade a razão da utilização desta leitura considero que, se estivéssemos no ano 10 D.C., seria apropriada, mas como já estamos em 2010, parece-me absurdo. Já contabilizaram o tempo que se passam a ler documentos? A grande maioria das pessoas já sabe ler e mesmo que não saibam, conhecem alguém que saiba e os possa ajudar. Sim, eu bem sei que mesmo sabendo ler, é complicado perceber aquela linguagem jurídica que eles insistem em usar nos processos. Devido a esta linguagem, demoram mais a escrever, têm de ler as sentenças, as pessoas têm de ouvir e depois ainda têm de contratar tradutores para traduzirem os termos usados para português corrente. Tudo isto provoca ainda mais atrasos nos processos judiciais.
- Injustiça – Outra das razões que provocam estes atrasos na Justiça são as injustiças. Muitos dos arguidos que são julgados são considerados inocentes quando deveriam ser considerados culpados e são colocados em liberdade. Estas injustiças provocam danos colaterais no sistema judicial uma vez que parte das vítimas ou dos familiares e amigos das vítimas acabam por perder a paciência (aqueles que não se contentam em acompanhar a série Dexter) e fazem justiça pelas próprias mãos, acabando por cometer novos crimes que por sua vez vão ser julgados e causar ainda mais entropia nos tribunais. É claro que alguns destes novos arguidos são culpados e alguns deles acabam por ser também considerados inocentes e isto provoca um novo ciclo de violência e de mais entropias nos tribunais.
Voltando ao processo Casa Pia propriamente dito… Foi divulgado hoje que afinal o Acórdão ainda não está pronto para ser entregue aos advogados dos arguidos porque decidiram culpar, mais uma vez, os coitados dos informáticos e pelos vistos o problema estava relacionado com as formatações do documento Microsoft Word que contém os textos e que não podiam ser convertidas para o formato PDF (que significa “Perda De Ficheiros”). Ao que pude apurar, o problema não estava bem na formatação, mas sim no elevado número de termos jurídicos usados nas centenas de páginas do documento. Como o Word não tinha activo o dicionário “Jurez”, não era capaz de reconhecer todos os termos usados e como tal, ao abrir o documento, o Word começava a sublinhar todas as palavras com o habitual sublinhado ondulado a vermelho (de erro) e o PC demorava cerca de 16 horas a processar todos os erros e caso alguém clicasse com o botão direito do rato em cima de um destes erros para ver sugestões para a respectiva correcção, o Word crashava originando um erro azul. O tribunal acabou por ter de envolver técnicos especializados em erros azuis da Microsoft para resolver isto e eles sugeriram três soluções:
- Entregar o documento Word aos intervenientes uma vez que não haveria problema de edição dos conteúdos do acórdão porque as versões do Word dos intervenientes iriam também crashar de certeza.
- Imprimir tudo para uma impressora directamente do ficheiro Word e depois digitalizar todos as folhas com um scanner directamente para um ficheiro PDF.
- Começar o processo todo de novo, tal como se faz com os programas da Microsoft para voltarem a funcionar quando algo de mau acontece.
Não cheguei a perceber qual das opções vão seguir, mas como ainda não entregaram nada a ninguém, presumo que tenham escolhido a terceira solução para o problema.
Durante todo este tempo, os arguidos têm-se dedicado, cada um à sua maneira, a ocupar o tempo. Vou expor aqui algum dos hobbies escolhidos por alguns dos arguidos deste processo.
Hugo Marçal:O Hugo Marçal decidiu escrever um livro para passar tempo e ao mesmo tempo tentar ganhar algum dinheiro com todo o processo. O título que escolheu para o livro foi “Sabão Azul e Branco” e tanto quanto pude apurar, o título é alusivo a uma história que se passou com ele quando precisava de ganhar algum tempo para reunir mais provas para o ilibarem (que pelos vistos não serviram de muito…). Ele foi a um WC do tribunal a meio de um interrogatório e para ficar doente de propósito e ser dispensado desse interrogatório decidiu comer um sabão azul e branco que lá se encontrava. Já fui a muitas casas de banho em toda a minha vida e nunca vi em nenhuma delas qualquer sabão, quanto mais, azul e branco. Vi casas de banho com sabonetes, com sabonetes líquidos e até sem nada, agora sabão azul e branco… Ok, partindo do princípio que era verdade e que existia lá nesse WC um sabão azul e branco, não acredito que o tenha comido para ficar maldisposto. Eu acho que a verdadeira história foi: ele foi mesmo ao WC e quando ia lavar as mãos com o sabão azul e branco, este escorregou-lhe e caiu ao chão e quando ele ia apanhá-lo e se viu naquela posição desprotegida na retaguarda, teve uma epifania e percebeu o que lhe iria acontecer quando fosse considerado culpado no final do processo e fosse para a prisão. É claro que ficou logo maldisposto uma vez que, apesar de supostamente já ter estado em situações com posições semelhantes, os intervenientes e os papéis estavam invertidos.
Carlos Cruz:O Carlos Cruz, apesar de pairar em torno da Justiça Portuguesa o tal mito dos problemas informáticos, decidiu ignorá-lo e construir um site na Internet onde foi e vai publicando informação sobre o processo Casa Pia. Não sei se por coincidência ou se por pura maldade, ou até por analogia aos actos supostamente praticados pelo Carlos Cruz às vítimas deste processo, o seu site foi também atacado por trás. Os hackers utilizaram a técnica de Trojan Horse (Cavalo de Tróia) como simbolismo da conquista de Tróia por parte da Grécia com a utilização de um cavalo de madeira cheio de soldados gregos e ainda como simbolismo à suposta utilização de cavalos de brincar por parte do Carlos Cruz como presentes para as crianças que pretendia conquistar. O site, que tem o endereço
http://www.processocarloscruz.com, já está de novo online uma vez que o Carlos Cruz utilizou o anti-virus e firewall Panda (talvez seja mais uma analogia aos ursinhos de peluche ou apenas mais uma coincidência no meio disto tudo). O que não cheguei a perceber no meio disto tudo foi se o Carlos Cruz apanhou 7 ânus, se apanhou 7 anos ou as duas coisas…
Resta-me terminar este pequenino post com mais uma das minhas habituais sugestões de melhoria. Proponho que se altere o termo Acórdão para outro mais adequado tendo em conta o estado da Justiça Portuguesa e sugiro os seguintes:
- Acordam – Mantendo a mesma pronúncia de “Acórdão”, o termo “Acordam” é muito mais adequado tendo em conta que os membros da Justiça Portuguesa parecem estar todos a dormir.
- Acordeão – Não tão adequado como o primeiro, mas mantendo também uma pronúncia muito parecida, o termo “Acordeão” transmite a ideia de farra, comparando com a farra que parece existir nos tribunais em lugar de trabalho e faz também lembrar os cantares ao desafio das festas populares em que, analogamente ao que acontece nos tribunais com os advogados de defesa e de acusação, duas pessoas intervêm, uma de cada vez, a exprimirem baboseiras em direcção ao adversário.
- Alcorão – O termo “Alcorão” é também apropriado uma vez que é muito parecido ao livro sagrado do islamismo porque tem muitas folhas, é sempre polémico, uns veneram-no de joelhos e outros tentam queimá-lo (deixo a explicação às várias analogias para as mentes dos leitores).
- Algodão – Como o “Algodão” não engana, o Acórdão poderia ser chamado de “Algodão” para que dessa forma a justiça fosse um pouco mais credível.